Mercado das Concubinas

Em Yangzhou, havia centenas de pessoas ganhando a vida com atividades ligadas aos "cavalos magros" (alcunha do mercado de concubinas). Nunca deveria alguém deixar que se soubesse que estava à procura de uma concubina. Uma vez que isso transpirasse, os agentes profissionais e intermediários, homens e mulheres, enxameariam como moscas à volta de sua casa ou estalagem, não havendo meio de mantê-los afastados. Na manhã seguinte, o homem encontraria muitos deles à sua espera, e o proxeneta que chegasse primeiro o carregaria, enquanto os demais seguiriam atrás, à espera de sua oportunidade.

Ao chegar à casa do "cavalo magro", o cliente seria servido de chá logo que se sentasse. Imediatamente a agenciadora viria com uma moça e ordenaria: "Kuniang (senhorita), cumprimente!" A moça fazia uma vênia. A seguir, era dito: "Kuniang, caminhe!" Ela caminhava. ((Kuniang, volte­se!" Ela se voltava, ficando de frente para a luz e seu rosto era mostrado. "Desculpe, podemos ver sua mão?" A mulher enrolava-lhe a manga e expunha o braço inteiro. Sua pele era mostrada. "Kuniang, olhe para o cavalheiro." Ela olhava, com o canto dos olhos. Seus olhos eram mostrados. "Qual é a idade da kuniang?" Ela respondia. Sua voz era mostrada. "Caminhe mais um pouco, por favor." Desta vez, a mulher erguia-lhe as saias. Seus pés eram mostrados. Há um segredo para julgar os pés das mulheres. Quando se ouve o roçagar de suas saias ao começar ela a andar, pode-se imaginar que tem pés grandes, mas, se usar as saias relativamente altas e mostrar os pés ao dar um passo para a frente, já se sabe que tem um par de pés pequenos, de que se orgulha. "Kuniang, pode retirar-se."

Logo que a moça saía, outra vinha e a mesma coisa se repetia. Costumeiramente havia cinco ou seis moças numa casa. Se o cavalheiro decidisse ficar com determinada jovem, colocar-lhe-ia no cabelo um alfinete de ouro ou outro ornamento; isto se chamava “tsatai”. Se nenhuma lhe parecesse satisfatória, uma gorjeta de algumas centenas de moedas era dada à agenciadora ou às criadas da casa e outra casa lhe era mostrada. Quando uma agenciadora completava o giro das casas com que operava, outras agenciadoras vinham. Isto continuava por um, dois, talvez quatro ou cinco dias. Era uma coisa sem fim e os agentes nunca se cansavam. Mas, depois que alguém via cinqüenta ou sessenta moças, todas eram mais ou menos parecidas, de cara pintada e vestido vermelho. É como escrever letras; quando se fez o mesmo sinal cem ou mil vezes, não é mais possível distingui-lo. O cliente não sabe o que decidir, ou qual preferir, e acaba por escolher qualquer uma delas.

Depois de feita a escolha, confirmada pelo tsatai, a dona da casa aparecia com uma folha de papel vermelho e um pincel de escrever. No papel estavam escritos os itens: sedas, flores de ouro, presentes em dinheiro e peças de pano. A dona mergulhava o pincel em tinta e deixava-o pronto para que o freguês preenchesse o total de peças e do presente em dinheiro que estava disposto a dar para ter a moça. Se isso fosse satisfatório, o negócio estava concluído e o cliente despedia-se.

Antes que chegasse à sua própria casa, já ali se achavam tamborileiros, e músicos, carroçados de carneiro e vinhos tintos e verdes. Num instante, papéis cerimoniais, frutas e pastéis também chegavam, e os remetentes voltavam acompanhados pelos músicos. Antes de terem andado um quarto de milha, retornavam com a banda, cadeirinhas de toldo floridas, lanternas florais, tachas, archotes de cabo, carregadores de cadeirinhas, damas de honor, velas, mais frutas, e assados. O cozinheiro chegava com uma carroçada de verduras e carnes, e doces, seguido de toldos, toalhas de mesa, almofadas para cadeiras, talheres de mesa, estrelas de longevidade, cortinados de cama e instrumentos de corda. Sem aviso prévio nem mesmo sem pedido de aprovação, a florida cadeira de toldo, e outra cadeirinha destinada a acompanhar a noiva, saíam para receber a nubente, com uma escolta de lanternas nupciais e achortes de cabo. Num átimo, a noiva chegava. Subia e realizava a cerimônia do enlace (curvando-se perante o noivo e os hóspedes), sendo então levada a ocupar seu lugar à mesa de jantar, já posta. Música e cantos começavam e havia muita bulha em toda a casa. Tudo era eficiente e rápido. Antes do meio-dia, a agente pedia sua comissão, dizia adeus e corria em busca de outros clientes.

[De “Memórias Sonhadas do Lago Ocidental” de Chang Tai 1597-1689]